segunda-feira, 12 de janeiro de 2015

Diante de um novo ano

Reproduzo, aqui, parte de mensagem feita a partir de escritos de Voltaire.  É uma prece, mas também um bom material para reflexão.



Deus de todos os seres, de todos os mundos, de todos os tempos. Se é permitido a frágeis criaturas, não percebidas para o resto do universo, atrever-se a Te pedir algo, a Ti, que tudo nos tens dado; a Ti, cujos decretos são imutáveis e eternos; olha com piedade os erros de nossa natureza. Que esses erros não sejam calamidades.


Afinal não nos deste o coração para nos aborrecer e as mãos para nos agredir.



Faze com que nos ajudemos mutuamente a suportar o fardo de uma vida penosa e fugaz.



Que as pequenas diferenças entre os trajes que cobrem nossos frágeis corpos, entre nossas insuficientes linguagens; entre nossos ridículos usos, entre nossas imperfeitas leis, entre nossas insensatas opiniões, entre nossas condições tão desproporcionadas aos nossos olhos e tão iguais diante de Ti; que todos esses matizes, enfim, que distinguem os átomos chamados homens, não sejam sinais de ódio e de perseguição.



Que aqueles que acendem velas em pleno meio-dia para Te celebrar, tolerem os que se contentam com a luz de Teu sol.



Que os que cobrem seus trajes com tela branca para dizer que devemos amar, não detestem os que fazem o mesmo sob uma capa de lã negra.



Que seja igual adorar-Te em dialeto formado de uma língua antiga e em uma recém-formada.



Que todos os homens se recordem de que são irmãos!



Se os açoites da guerra forem inevitáveis, dá-nos condições de não nos desesperarmos.



Que não nos destrocemos uns aos outros em tempos de paz.



Que empreguemos o instante de nossa existência em bendizer em milhares de idiomas, desde o Sião até a Califórnia, Tua bondade que nos concedeu este instante.



Originados da mesma fonte, amparados pelo mesmo Pai, todos os homens somos irmãos.



Se as fronteiras nos dividem em países e nações, se os idiomas nos criam dificuldades de comunicação, se as distâncias nos impedem de nos entrelaçarmos, a vibração da fraternidade deve vigorar em nossos corações.



Todos fomos criados por amor, somos filhos da Luz e destinados à Luz.



Por ora, e somente por agora, nos situamos em painéis diferentes. Mas um dia, além do corpo, transcorrido todo o caminho, todos chegaremos ao mesmo fim. A casa do Pai. A perfeição.

terça-feira, 6 de janeiro de 2015

Se eu fosse eu


Quando não sei onde guardei um papel importante e a procura se revela inútil, pergunto-me: se eu fosse eu e tivesse um papel importante para guardar, que lugar escolheria? Às vezes dá certo. Mas muitas vezes fico tão pressionada pela frase “se eu fosse eu”, que a procura do papel se torna secundária, e começo a pensar. Diria melhor, sentir.
E não me sinto bem. Experimente: se você fosse você, como seria e o que faria? Logo de início se sente um constrangimento: a mentira em que nos acomodamos acabou se ser levemente locomovida do lugar onde se acomodara. No entanto já li biografias de pessoas que de repente passavam a ser elas mesmas, e mudavam inteiramente de vida. Acho que eu fosse realmente eu, os amigos não me cumprimentariam na rua porque até minha fisionomia teria mudado. Como? Não sei.
Metade das coisas que eu faria se eu fosse eu, não posso contar. Acho, por exemplo, que por certo motivo eu terminaria presa na cadeia. E se eu fosse eu daria tudo o que é meu, e confiaria o futuro ao futuro.
“Se eu fosse eu” parece representar o nosso maior perigo de viver, parece a entrada nova do desconhecimento. No entanto tenho a intuição de que, passadas as primeiras chamadas loucuras da festa que seria, teríamos enfim a experiência do mundo. E a nossa dor, aquela que aprendemos a não sentir. Mas também seríamos por vezes tomados de um êxtase de alegria pura e legítima que mal posso adivinhar. Não, acho que já estou de algum modo adivinhando porque me senti sorrindo e também senti uma espécie de pudor que se tem diante do que é grande demais.
Clarice Lispector, 1968.

sexta-feira, 12 de dezembro de 2014

Meus votos para este tempo de festa!



Para todo solo árido,
existem rios cristalinos de alegria.

Para toda ilha de afeto sonegado,
existem arquipélagos de esperança.

Para todo bailar em desafinados acordes,
existem rodopios de pássaros, anjos e estrelas.

Para todo crepúsculo,
existe o milagre da vida que desafia, descortina e reverencia a aurora.

No Natal e em 2015, estejam EM VOCÊ:
os rios, os arquipélagos, os rodopios, o milagre.

quinta-feira, 11 de dezembro de 2014

De volta, neste Dezembro!

Depois de alguns meses sem postar, estou de volta.  Recorro, mais uma vez, ao glorioso Drummond para "abrir" o mês (aqui no Blog) e meu retorno ao espaço:
  

Quem me acode à cabeça e
ao coração
neste fim de ano, entre 
alegria e dor?
Que sonho, que mistério, 
que oração?
Amor.
 

(Carlos Drummond de Andrade - Dezembro de 1985)

quarta-feira, 17 de setembro de 2014

ONU exclui Brasil do mapa da fome

O relatório da FAO – braço das Organizações das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura –, divulgado no dia 16 de setembro, excluiu o Brasil do mapa da fome e da miséria no mundo. 

O documento mostra que havia 19 milhões de pessoas em situação subalimentar no Brasil há 11 anos e hoje existem 3,4 milhões, ou seja, 1,7% da população. A ONU excluiu do mapa da fome os países que têm menos de 5% da população em situação subalimentar. “É a maior demonstração de que o sonho de uma geração, de ter um país sem fome e sem miséria, está sendo realizado”. “Agora o fim da miséria é só o começo”,  disse a presidente Dilma.


“Só tem 37 países na mesma situação que o Brasil”, reforçou a presidente. 
Dilma atribuiu a redução da fome no país a programas sociais da gestão petista, como o Bolsa Família, associados a outros índices favoráveis de inclusão social, como a ampliação das vagas de emprego, valorização do salário mínimo e o aumento do número de microempreendedores individuais. 
Outro fator que contribuiu para atingir essa meta – que faz parte das metas do milênio – foi, segundo Dilma, o fortalecimento da agricultura familiar. Ela citou um programa de educação que obriga a aquisição de uma cota de 30% de alimentos da agricultura familiar para a merenda escolar. Dilma afirma que essa foi uma das medidas que contribuiu para reforçar a ingestão de proteínas na alimentação dos brasileiros. 

Leia na íntegra em:
http://www.valor.com.br/politica/3698644/dilma-comenta-relatorio-da-onu-que-exclui-brasil-do-mapa-da-fome, por Andrea Jubé e Bruno Peres. 



terça-feira, 16 de setembro de 2014

Wanderley Guilherme dos Santos: ” A oposição quer colher o que não plantou”

Quando escreveu a obra Quem vai dar o Golpe no Brasil?, em 1962, Wanderley Guilherme dos Santos conquistou um respeitável espaço na ciência política ao antever a tramoia civil-militar detonada dois anos depois, que interromperia por quase três décadas os avanços sociais, políticos e culturais do país. Desde então, jamais deixou de investigar as contradições e desafios da democracia brasileira. Ainda hoje, estuda de seis a oito horas por dia para quatro pesquisas acadêmicas – sem deixar de desfrutar, “a lazer”, de livros de arqueologia, romances policiais e séries do Netflix.
Com história acadêmica ligada à Universidade Federal do Rio de Janeiro, onde graduou-se em Filosofia em 1958, hoje é professor aposentado de Teoria Política da UFRJ, professor e fundador do Instituto Universitário de Pesquisa do Rio de Janeiro (Iuperj). A completar 79 anos no próximo 13 de outubro, com 18 obras publicadas, dedica um de seus trabalhos a desconstruir as contradições entre os liberais contemporâneos e a escola do pensador Adam Smith, precursor dessas teorias no século 18, mas que mesmo ele ainda pressupunha ter uma dose razoável de valores morais humanistas e solidários a sustentar as sociedades que viriam a fundar o capitalismo – “Vivemos o mundo da antipatia social”, diz.
Para o cientista, poucas vezes o Brasil tentou empreender um ciclo econômico mais expansivo para o desenvolvimento humano. Teve alguns períodos, com Getúlio Vargas e Juscelino Kubitschek, em que os avanços acabaram sendo alvos de “vetos das elites”. Segundo Wanderley, as políticas sociais iniciadas por Lula em 2003, seguidas de investimentos em infraestrutura antes negligenciados pelos governos de plantão, iniciaram um novo ciclo – mantido e ampliado por Dilma –, que permitiu ao país trilhar rumos diferentes dos ditados pelas potências do centro econômico que semearam a crise mundial de 2008. Ele acredita que o Brasil está pronto para novos saltos de crescimento em seu PIB nos próximos anos. Está em jogo nestas eleições uma disputa com a velha oposição despida de projetos, ávida para desfrutar desse legado e desviar-lhe da rota mais adiante.
Um trabalho seu de 1962, Quem vai dar o golpe no Brasil?, anteviu 1964. E hoje, o senhor vê algo que permita temer um choque de retrocesso da democracia?
Em absoluto. Em 64 havia uma fragmentação das forças políticas relevantes, além de a própria sociedade também estar muito fragmentada. Isso tornava impossível a formação de uma coalizão sustentável de apoio ao governo. Por outro lado, a oposição também estava de tal modo fragmentada que não conseguia formar uma coalizão alternativa, só conseguia formar uma coalizão de veto. E havia uma radicalização ideológica profunda que não permitia uma composição. Era impossível a negociação política. A proposta hegemônica da esquerda no período, de pressionar pela aprovação de um projeto consistente de desenvolvimento, era suicida. Isso hoje não existe.
Em um artigo recente na revista CartaCapital, o senhor fala da presença, no cenário político, dos “especuladores da moral”. Qual é a semelhança entre eles e os especuladores do mercado financeiro?
Os especuladores dos mercados financeiros lucram com expectativas. Não criam nada, captam recursos e os revendem. O lucro deles não vem da criação de produto. Vem da diferença obtida com a especulação. A mesma coisa são os especuladores do mercado político. Eles criam fatos e factoides, podem eventualmente “lucrar” algo, um acréscimo em termos de aprovação, mas sem a criação de um projeto. A fama ou o apoio que recebem não decorre de uma sugestão de valor nacional ou econômico, mas de uma expectativa. É simplesmente “vamos acabar com a corrupção”, “isso tudo precisa mudar” etc. O sucesso tanto em um caso, o especulador financeiro, quanto no outro, o especulador moral, não decorre da criação de nada. Decorre da manipulação de expectativa. É a mesma coisa.
O mundo ainda sofre efeitos da crise de 2008, mas os países do centro econômico ainda querem restaurar os mandamentos que desencadearam a crise. Os mercados podem determinar as dinâmicas dos governos?
O potencial de novas ondas especulativas escapa da possibilidade de intervenção de governos como o brasileiro e de outros países emergentes. O que cabe a países como Brasil, Índia, Argentina, México, é administrar a defesa dos efeitos negativos desses ciclos. E nesse sentido o desempenho do Brasil tem sido espetacular. Mas os empresários brasileiros ficam na expectativa das decisões do FED (o banco central norte-americano) mais que das decisões do BC. Isso mostra o caráter subordinado de uma parte da economia brasileira, e curiosamente a que tem um papel importantíssimo, uma vez que os estímulos para a expansão e fortalecimento desse segmento industrial têm sido dados sistematicamente pelo governo, pela defesa do mercado interno justamente quando acaba o mercado externo. O empresariado pouco moderno não acompanhou a transformação do país.
Fala-se muito em gargalos de infraestrutura que não deixam o país ser competitivo, o que, aliás, não é de hoje. O país deixou de fazer alguma lição de casa?
Aí é que está a questão. Durante décadas, o Brasil, seus governantes e mesmo seu empresariado nascente não estavam dispostos ou preparados nem para sonhar com um país moderno, economicamente forte, aquilo que eles diziam que queriam. Na década de 1930, o debate fundamental era se o Brasil só devia exportar ou se devia criar indústria. Então, durante todas essas décadas, em não havendo sonho da possibilidade de um país moderno, não foram lançadas as condições básicas dessa modernidade, rodovia, ferrovia, aeroportos, transportes hídricos, nada. Isso tem a ver com o PIB, hoje dito pequeno, e do qual a oposição brasileira deseja se aproveitar nos próximos anos.
O que está acontecendo agora é justamente um investimento maciço naqueles setores, nas condições absolutamente necessárias para o crescimento do PIB. Porque no contexto existente não haveria mais como crescer o PIB, não tem mais pra onde andar o agronegócio, não tem como as empresas industriais crescerem. Então, o Brasil cresceu enquanto foi possível. Para crescer mais, não tem jeito: tem de expandir isso, e isso obviamente, enquanto está sendo feito, reduz um pouco a capacidade de crescimento. Agora a partir de 2016, 2017…
Os números do PIB são confiáveis e essenciais?
O número considerado do PIB é o geral, a média do país. Se tomarmos por setores, transporte, aeroviário, portuário, seria muito diferente. O número geral dilui os indicadores e tem servido pouco para medir o que está se passando no país em termos de transformação. O crescimento do PIB do Nordeste nos últimos anos é três a quatro pontos percentuais acima do crescimento nacional. O do Centro-Oeste é PIB chinês. Como o indicador nacional inclui tudo isso e misturado, fica pequeno. Quando todos os investimentos – em geração de energia, portos, estradas etc. – que hoje estão sendo feitos estiverem em condições de operar, o PIB vai ser uma enormidade. A oposição sabe disso. E se chegasse ao governo se apropriaria. Diria: “Tá vendo? Como eles não sabiam governar, o PIB agora está crescendo”. Seria fácil, porque, até apesar dessa oposição, o PIB vai crescer. Houve o crescimento da renda e do mercado interno, está havendo crescimento da infraestrutura e descentralização da economia – o que era fundamental. A oposição quer colher o que não plantou.
A propósito de oposição, fala-se muito numa suposta necessidade de medidas impopulares, reduzir salários, promover desemprego para segurar a inflação, cortar gastos públicos. Precisa?
Do ponto de vista do manual ortodoxo da economia, e daí o meu espanto com a mediocridade dos nossos economistas de oposição, eles estão certos. Afinal, é isso que está escrito nos livros, e eles não conseguem dizer outra coisa. Mas estava escrito em 2002 também, em 2005, 2006. E a partir de 2007 o país começou a fazer o PAC, o Plano de Aceleração do Crescimento. E em 2008, quando começou a crise braba, o Lula já havia promovido um processo de substituição de consumidores. Durante muito tempo, o Brasil viveu um processo de substituição de importação. A partir das políticas de transferências de renda, de valorização do salário mínimo, de estímulo ao consumo interno, o Brasil chegou a 2007, 2008, pronto para um processo de substituição de consumidores. E isso não ocorreu a nenhum deles da oposição. Não há uma determinação divina de que a aplicação de sua cartilha seja inevitável. A espécie humana sobrevive justamente por sua capacidade de se reinventar e superar desafios. E não por reincidir em experiências desfuncionais, como essas medidas de austeridade. Como é que elas podem ser consideradas remédios eficazes para os mesmos problemas que ajudaram a causar?
Em 2006, antes da reeleição do Lula, seus articuladores argumentavam que o governo ainda devia muito ao país, pois não se resolvem 500 anos de problemas em quatro. Que ficou devendo em relação ao que havia prometido, mas que não ficou devendo a nenhum governo anterior. Esse diagnóstico ainda perdura?
No primeiro mandato, de 2003 a 2006, foram lançadas bases de uma política social que propunha distribuição de renda. Bolsa Família, valorização do salário mínimo, ProUni, redução de impostos, política de cotas, Minha Casa, Minha Vida… Agora, é preciso equacionar as reformas por onde vai caminhar o desenvolvimento, senão nem essas políticas se sustentam. Há uma lista enorme de programas criados entre a década passada e depois de 2010. Hoje, para gente que antes não existia, há a presença do Estado do berço à velhice, mas isso será sempre pouco, estará sempre aquém da capacidade de qualquer governo. A política social “cria problemas” para si própria. Excelente! Então, a partir de 2007, começa uma mudança estrutural em relação aos eixos anteriores e tudo isso deixa um legado histórico. O que está sendo feito é o Brasil moderno, do século 21, não é brincadeira. Agora é que estamos terminando a primeira grande fase do governo dos trabalhadores, que se deu em duas etapas, uma de 2003 a 2006 e outra de 2007 para cá. E agora virão os grandes PIBs.
O que definiria a ruptura com a “outra fase”?
O Pronatec já havia sido criado pelos quadros do Ministério da Educação ainda no governo Fernando Henrique Cardoso, mas o governo vetava. Já existia um programa social aqui e ali, mas que não fazia diferença na vida do país. Então, a ruptura foi em 2003, quando se dá um significado maior a esses programas e a seus efeitos. E agora continua. O que existe hoje é um conjunto de políticas destinadas a segmentos sociais que até 2002 não faziam parte dos roteiros governamentais. A agenda de vetos dos governos elitistas, até 2002, era maior que a agenda positiva. A elite se unia em torno do que não queria que fosse feito. A ruptura com isso teve de ser enorme, e está sendo. E quando você mexe em algo em que antes não se mexia tem consequências. Então, claro que há deficiências, mas criadas pelo avanço. E que só pelo avanço serão resolvidas.
A existência de mais de 30 partidos não é um entrave para o entendimento pelos cidadãos da democracia e da política como meio de ­realização de suas aspirações?
Não é a quantidade de partidos que determina se o sistema político funciona ou deixa de funcionar. A Inglaterra, por exemplo, tem 12 partidos, mas a taxa de desperdício de voto na Inglaterra, ou nos ­Estados Unidos, é fora do comum. O Brasil tem uma das menores taxas de desperdício do voto do mundo, porque aqui todos os votos contam: o seu voto para uma pessoa, mesmo que ela não se eleja, conta para a coligação. Na verdade, haveria muito menos problemas se não tivesse um segundo turno eleitoral. A necessidade de ir para um segundo turno é que faz com que você tente se apropriar de uma mercadoria criada pelo Tribunal Superior Eleitoral, que é o tempo de televisão, a moeda de chantagem dos pequenos partidos.
O senhor acha que a Marina é uma terceira via como pretendia ser o Eduardo Campos?
Marina Silva é o que há de mais atrasado dentro do espectro político brasileiro. Ela é atrasada economicamente, na concepção de sustentabilidade que tem, na modernização da política da produção, em termos de costumes sociais, em relação a tudo. É uma missionária retrógrada. E pode ganhar uma campanha contra ela, se ameaçar Aécio.
Os protestos do ano passado produziram um impacto negativo sobre a política – sem nome, sem rosto, nem classe, nem lado – e também ao PT e a Dilma. Por que os outros políticos não foram chamuscados?
Eu não tenho resposta para isso a não ser uma brincadeira: São Paulo deveria ter sido vitorioso em 1932, porque isso só acontece em São Paulo. Em Minas, que foi o terceiro estado a ter mais depredação e violência, o Fernando Pimentel (PT) está levando numa boa. E aqui no Rio, o segundo, não existe PSDB. No Rio sempre foi uma disputa ruim, mas não como São Paulo. O Garotinho é o norte atrasado do estado. Não houve nada no Norte Fluminense em junho de 2013, nem em 2012, nem em 2011, está fora do tempo. E o Garotinho que querque continue atrasado, porque se avançar ele deixa de ser representante. O Crivella é o evangélico. Pezão é um centro mais moderno, mas não é “político”. Lindberg é aventureiro. Então, o Rio de Janeiro está essa porcaria.
O senhor escreveu que considera a mídia brasileira fechada e reacionária e que a principal vítima disso é o cidadão comum. Por que o governo não mexeu nesse vespeiro?
Eu diria que é o dilema do revolucionário. Um líder revolucionário não toma uma iniciativa se não sabe qual apoio terá. Há dois erros possíveis de cálculo: um é não tomar a iniciativa quando haveria um apoio grande, mas que não pode se manifestar porque não houve uma ação inicial, uma sinalização; outro é quando há a iniciativa e não há apoio nenhum. Eu não sei qual foi o cálculo feito pelo governo. Mas se pensa que tem pouco apoio para essa medida, está temeroso demais.
Estaria superestimando o poder das empresas de comunicação…
Eu acho que esse foi o cálculo. Então, tem de haver um poder de persuasão. Se tomar iniciativa, poderá constatar que o mesmo povo que antes da revolução parecia não estar nem aí pode chegar e dizer “opa! era por isso mesmo que eu não estava satisfeito, eu vou nessa…” O próprio ato ilustra, ilumina, esclarece. Eu posso citar Lênin: a revolução educa. Há uma óbvia insatisfação do cidadão educado, que busca revista, jornal, procura se informar. E pra isso é que existe a política, para dar exemplo, fazer e ver o que acontece. Não vai ter censura nem restrição de liberdade. Quem não está satisfeito com o jornal vai querer que o jornal acabe? Não. Vai querer um jornal melhor.
O que o senhor acha do ensino universitário? O número de universidades públicas aumentou, algumas passam por crises. No geral, a universidade brasileira vai ajudar a construir um novo modelo de sociedade? Ou ficou voltada para formar reprodutores do sistema baseado no consumo?
O crescimento indubitável do número de universidades e de universitários fatalmente vai levar a uma redução do nível. Vai ter de haver um tempo de maturação para que essas universidades passem a ter realmente um papel maior na criação do saber. E não vejo como justo cobrá-la disso agora. Há, sim, nichos de excelência que estão botando pra quebrar. Mas o problema é que a universidade no mundo todo está ficando obsoleta, porque a taxa de crescimento do conhecimento e suas subsequentes criações tecnológicas estão a uma velocidade que a universidade leva tempo para alcançar. A universidade é uma organização, uma forma de garantir a manutenção e a difusão do conhecimento, e nela outros conhecimentos vão surgindo. O problema é que hoje a universidade difunde um conhecimento que já é obsoleto.
O mundo está perdendo a fertilidade de líderes e pensadores? Ainda vai haver inteligência capaz de propor novas soluções?
Ah, vai, de outro tipo, mas vai. Eu tenho um neto de 8 anos, ele vive num mundo do qual eu não participo. Sabe tudo, faz o diabo, tem opiniões estéticas dos filmes que vê com o pai e a mãe, sobre pintura, vai a museu. Essa cultura faz parte da formação dele. Eu sou um homem obsoleto, mas as novas gerações não são. Tenho dificuldades de incluir na minha concepção humanista certos tipos de procedimentos ou de concepções, que eles tratam de maneira perfeitamente natural.
Assim como o século 19 absorveu tudo aquilo que foi criado no século 18, que foi um século de explosão cientifica. Enquanto pensadores do século 18 resistiram às novidades, os do século 19 reagiram numa boa. Isso pra mim (aponta para o computador) não é natureza. Pra mim, natureza é datilografia, aprendi numa boa; aprendi taquigrafia… Então, o problema da universidade é complicado, de longo prazo e não sei como vai ser resolvido. Eu sei que o que ela está ensinando é obsoleto, mas quais são os canais para refazer aquela junção entre a difusão e a inovação? Não faço ideia.
O senhor ainda lê muito?
Estou trabalhando em quatro pesquisas. Uma ­delas tem a ver um pouco com esse “mundo.com”, ­esse mundo novo, do ponto de vista social. Esses grupos pequenos que aparecem têm a ver com o ­processo importantíssimo da divisão social do traba­lho globalizado que está em andamento e é irrever­sível, vai tomar conta. Eu estava lendo ­ontem que o (empresário do setor de siderurgia) Jorge ­Gerdau ­está montando­ fábrica não sei onde porque­ fica mais barato do que montar aqui. Imperialismo moderno. Um produto hoje tem um componente fabricado na Austrália, outro na Inglaterra, outro no Rio Grande do Sul, e mesmo incluindo os custos de transporte, e instalando uma outra unidade não sei onde para receber tudo e montar, sai mais barato do que fazer tudo numa planta só. É o outsourcing economics. Provoca impacto nas cadeias produtivas e também nas cadeias de solidariedade entre os trabalhadores. Não há uma formação de uma identidade permanente de um certo setor, porque não tem “um” setor. Parte dos precarizados da Espanha tem a ver com isso.
E como está indo?
Eu comecei com Adam Smith (precursor da teoria do liberalismo econômico, 1723-1790) e os clássicos. Sempre houve na economia de mercado uma tensão entre o interesse material e os valores morais – simpatia, benevolência, solidariedade, nada disso junta com interesse material. Isso é uma tensão muito grande, em todos os séculos que eu estou vendo, de lá até o momento atual. Que é um momento de subversão, de recusa da tentativa de encontrar uma solução que compatibilize, é um momento de “fodam-se”. Smith desenvolveu o conceito do fundamento utilitário da simpatia social, termo com que ele explicava a origem da capacidade da humanidade, apesar da naturalidade de seu egoísmo, de imaginar-se no lugar dos outros, o que torna as pessoas conscientes de si e da moralidade de seu comportamento. E a desistência dos pensadores liberais contemporâneos em relação é isso é total. Então, é o mundo da antipatia. Estou te dando de primeiríssima mão como é que eu vou estudar o mundo moderno no qual o Brasil está entrando.
Seria o mundo da desumanização das relações?
É. Você vê aquela disputa em torno da biografia autorizada? Você transforma tudo em mercadoria, não é? A biografia só autorizada significa o seguinte: eu faço da minha vida uma mercadoria. A Paula Lavigne, é isso que ela está dizendo: “Não é que a gente não queira, só precisamos negociar…” O Roberto Carlos está vendendo a própria biografia. É claro que é seletiva. Uns pedaços que dão mais ibope. O resto ele não conta. “A vida secreta de Roberto Carlos por ele mesmo”…
Mas vai vender…
Oh! Mas, meu caro, esse é o mundo horroroso no qual nós estamos entrando. É claro que isso não vai ficar sem resposta. Nem sem reação. Esse é o inimigo. A “mercadorização” de tudo. O cálculo utilitário levado às últimas consequências.

por Paulo Donizetti de Souza, da RBA
Colaborou Vitor Nuzzi
In: http://www.viomundo.com.br/politica/wanderley-guilherme-dos-santos-2.html 

Moça, você é tão bonita

Depois de quase um mês sem postar, volto com um poema que encontrei na página do face de minha nora, compartilhado por ela da página "Não Khalo".  Como todo bom poema, faz bem à alma e ao coração.  Nesse caso, em especial ao coração feminino, esteja ele em que corpo estiver.


É tão bonita quando não cala
Não descansa e vai pra luta
Quando é pouco dos outros
E muito mais tua. 
 
Moça, você é tão bonita
Quando grita
Quando não se apaga
Quando se irrita

Moça, você é tão bonita
quando se une
Quando se basta
Quando se soma

É tão bonita
Sua luta
Sua poesia
Sua calmaria
Sua indignação

Quando você
Não se perde
Quando sua força
Cresce
Quando resiste
Quando persiste
Fica tão mais bonita

Quando não se esvazia
Nem um pouco metade
Nem pouco vazia
É tão bonita quando não cala
Não descansa e vai pra luta
Quando é pouco dos outros
E muito mais tua